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  • Foto do escritorDuda Rodrigues

Definições

Parte do meu trabalho como estagiária na área da biologia, mais especificamente botânica, envolve a descrição de plantas. Estou auxiliando em um levantamento de informações diversas sobre mais de 180 plantas, e parte disso envolve a busca de descrições precisas para diferenciá-las, caracterizá-las, defini-las.

Na verdade eu não preciso descrevê-las, mas sim buscar em bases de dados boas definições já feitas, e ajustar para uma linguagem mais tranquila, entre a científica e o senso comum, para que esteja correta mas também mais simpática aos olhos de todos.

Durante essa pesquisa, muitas vezes me deparei com uma situação que quis trazer aqui, por ter me deixado reflexiva. Em muitas descrições encontrei trechos como " x coisa ausente", "ausência de y", "w coisa não presente". Isso me fez questionar, "porque muitas vezes definimos coisas com base no que lhes falta ao invés do que as compõe ?".

Depois de repassar esse questionamento em minha mente cheguei a algumas considerações. A primeira é que eu acredito que isso está atrelado a algo muito mais profundo do que meras definições. Talvez à forma como pensamos o coletivo x individual.

Como sociedade acabamos focando muito mais nas diferenças do que nas similaridades entre cada um de nós. Tentamos impor limites entre grupos para diferenciá-los, com base em diferenças. Não estou falando que para tudo e a todo tempo é assim, mas em muitos casos acontece. Guarde esta informação.

Outra consideração, é que muitas vezes estamos mais preocupados com a vida alheia do que com nossa individualidade, nosso autoconhecimento. Enxergamos o que tem na vida do outro e não tem na nossa. Criamos lacunas de coisas que nos faltam, sem saber ao menos do que precisamos, criando falsas ideias e ilusões de vontades que sequer tem um fundamento, pois foram criadas com base na ausência de e não presença - sim o capuz serve especialmente para o mundo virtual.

Agora, junte um pensamento que busca diferenças a uma falta de autoconhecimento e constante comparação. Muito provavelmente cairemos nesse limbo de falsas ideias. Quantas vezes você já pensou "ah não sou bonitx", "não sou engraçadx", "não tenho nada de interessante", "não sou muito alta nem muito baixa", "não sou sociável", ou qualquer qualidade/característica. Que tal parar um pouco e pensar no que te define, quais são suas características físicas, de personalidade, o que for, que te compõem. Não podemos julgar as coisas com base na ausência, ou de fato ficaremos sem conteúdo.

Busco então usar afirmações na hora da descrição das plantas. Espécie A: possui folhas de tal forma, têm flores de tal cor, seus frutos possuem tal aspecto. E assim por diante para a espécie B, C, D... Assim, quando for compará-las posso citar o conteúdo de ambas como forma de diferenciá-las, ao invés de citar o que uma possui e a outra não, caindo na falsa ideia de que uma é mais do que a outra, tem algo a mais do que outra. É claro que diferenças existem, elas são diferentes, mas o são por seu conteúdo, e não pelo que lhes falta.

O que quero dizer é que o que nos guia ao pensamento de diferenciação não deveria ser comparável pela presença/ausência dessa forma. Um pensamento de diferenciar coisas por presença/presença seria mais lógico, universal, instaurador de menos conflitos (pessoais e interpessoais). Não existe característica mais e característica menos, e a forma que utilizamos para descrevê-las, citá-las é relevante para a construção dessa ideia intrínseca.

Cada um tem que olhar para dentro, ver do que é formado, o que te enriquece, o que você tem. Quando temos certeza do nosso conteúdo, talvez o conteúdo do outro pareça menos algo que nos falte, e passe a ser apenas o que compõe o outro. Entendendo nossas características, demandas, caímos menos no buraco da comparação com algo que não é nossa realidade, que não pode ser comparado. Afinal, existem infinitas possibilidades na vida, como comparar as coisas com base na inexistência de algo que simplesmente não foi um caminho para você.

Hoje aprendi em um pequeno insight sobre como, portanto, buscar menos diferenças por ausências, e sim por singularidades. Dessa forma, as diferenças deixam de ser critérios para separação, e se tornam critérios agregadores, complementares. Acho que isso tem a ver com empatia, com respeito...

Porém quem sabe seja apenas um devaneio, e eu tenha ido longe demais refletindo em cima de algo que deveria ser apenas uma descrição morfológica de uma planta. Toda vida é válida, e a forma de vida das plantas é muitas vezes subestimada, sem se quer ser inclusive vista como vida frequentemente, e por isso não me importo, de trazer reflexões com base no universo delas, de extrapolar metáforas.

Não sei se você vai achar interessante o que leu, ou se ao menos consegui construir uma linha de raciocínio lógico sobre algo abstrato. Contudo, espero que de alguma forma esse texto possa ter sido uma semente para que sua mente viaje em possibilidades, e que você possa parar para pensar no que te compõe, e não no que te falta.

Eu não trago verdades, nunca procuro trazê-las na minha escrita. A verdade é algo relativo, trago sempre, e apenas, reflexões. Se tem uma coisa que me compõe é o ato de questionar tudo, e escrevendo aqui busco compartilhar algumas respostas pessoais (e claro, relativas) sobre alguns desses questionamentos.


Obrigada!


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